sábado, 28 de fevereiro de 2015

Fim de semana!


O horário de trabalho é das 7h00 às 17h00 todos os dias e ao Sábado das 7h00 ao 12h. Rapidamente me apercebi que esse horário só figurava no papel. O meu trabalho era prolongado sempre até às 22h e de manhã poucos eram os dias em que se começava depois das 7h.
O dia de sábado parece um dia de trabalho normal.

Esta noite não dormi quase nada. Já me tinham dito que as trovoadas no Congo eram mais intensas, mas nada me preparou para o que se passou esta noite.

Eram 4h e eu fui acordada com o meu contentor a ressoar (tremer). O primeiro raio da tempestade tinha caído ali perto. O barulho não tardou a chegar. A chuva começou a cair com força e com ela trouxe ainda mais relâmpagos. De repente parecia dia, e que dia. O barulho dos relâmpagos, o tremor dos contentores e  de todo o conteúdo...
A certa altura começo a ver água no chão. "Porra, deixei a janela aberta!" pensei. Mas não. A água da chuva era tanta que já tinha a sanita a transbordar... "Oh Fuck!"
Tentei voltar a adormecer, mas o barulho e o medo não me deixavam. Fiquei sentada na cama a tentar ouvir o que se passava lá fora, "Será que isto é normal? Está tudo bem?"..

Enfim, depois desta tempestade deixei de ter medo da trovoada em Portugal. Pff, Trovoada de meninos!

Comecei a trabalhar eram 7h. "Aquela trovoada de ontem é normal?"perguntei na minha inocência. "É" respondeu o Davide, "e aquilo não é nada!"
"Não é nada! Fuuuuu!!! Tirai-me já bilhete. Eu ontem estava cheia de medo, nem dormi nem nada..."
"Tu habituas-te!!"

O trabalho decorreu normalmente, Sábado é dia de Limpeza na obra. Passei a manhã a ver os avanços que tinham sido feitos durante a semana e a familiarizar-me com o projecto que tinhas nas mãos.
Os trabalhadores cantavam e resmungavam uns com os outros.

A certa altura há um que vem ter comigo e me diz qualquer coisa em Francês. "Je ne comprend" disse eu meia aflita. Basicamente o homem estava-me a pedir dinheiro porque já não tinha para dar aos filhos.
Quando percebi o que ele queria respondi "pas d'argent" e não tinha mesmo. Os 100 euros que tinha trocado no aeroporto para francos da Africa central tinham ficado em Brazaville, com o Nuno, para o câmbio. Comigo não tinha dinheiro nenhum.

Subi para o escritório. Ufa! 1km debaixo deste sol abrasador dá cabo de uma pessoa.

"És tu que vais pagar a "tainada" hoje?", diz o Franco.
"Tu também a pedir-me dinheiro? Não tenho pah!"
"O Davide empresta-te" diz o Franco.

E emprestou! 40000 FCFA cerca de 60 euros.
De tarde fui às compras. O Regal, supermercado Libanês, é o único que se assemelha com um supermercado Europeu. As coisas estão arrumadas em prateleiras e com o preço marcado.
"Hum!!! O que vou levar para beber?... Whisky!!! Parece-me bem!

Paguei 7500 FCFA por uma garrafa de Red Label, cerca de 12 euros.

Depois do jantar começou a animação. Puxamos das garrafas e começamos a beber socialmente. Eram 22h quando começa-mos com os drinking games. Alguns dos trabalhadores, expatriados / brancos, nunca tinham jogado. O resultado foi uma animação caótica. A certa altura estávamos todos a correr à volta da mesa e a cantar.

Partimos para a discoteca, três carrinhas cheias de pessoal animado. A discoteca era um tasco, com umas mesas e uns sofás. A pista de dança tinha espelhos a toda a volta e o tecto estava forrado com toalhas de mesa de plástico. Quando entramos sentimos logo o bafo a suor e vomitado. Nada agradável. O espaço era pequeno de mais para tanta gente. Estávamos a ser exprimidos pelos congoleses. A certa altura comecei a sentir alguém a puxar-me o cabelo. "Ei! E quê?" respondi eu em português. "Não te preocupes, são elas a ver se é cabelo verdadeiro" diz-me o Tony.

Pedimos uma bebida. Foi-nos servido um copo de whisky quente com uma base de copos imunda em cima. "Eu não vou beber isto" disse eu, mas a sede era tanta que la tive que beber.

Tentei chegar à pista de dança e pelo caminho senti algumas mãos a apalparem-me. Chateei-me e comecei a cerrar os punhos e carregar em todas as direcções.
"Tem calma! Eles nunca viram uma branca!" dizia o Tony.
"Ver! Ver é com os olhos!" respondi eu indignada.

Na pista de dança foi criado um circulo à minha volta, tipo protecção. Dancei imenso. Os congoleses estavam concentrados em frente ao espelho. Muito gostam eles de dançar para o espelho!!!

Sempre que saía do meu circulo sentia mãos a puxarem-me e ouvia os gajos a tentar meter conversa. "Je ne parle françois" dizia eu como que a despacha-los.

Nunca fui tão assediada. O meu Ego estava lá em cima!

Estava a escorrer suor quando vim cá para fora para apanhar ar. O que vi deixou-me chocada.
Já tinha percebido que as congolesas faziam tudo por dinheiro, mas não sabia que havia público para esse "tudo".

Não vou entrar em detalhes sobre estes assuntos, até porque o blog é público, mas fiquei chocada! Whatever! O que se passa no Congo fica no Congo!


Ring's of fire!

O Domingo de tarde foi passado a queimar as calorias. Descobri umas TRX aqui :)



 




segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A obra!

Depois de um almoço reconfortante fomos ver os trabalhos. Ao que parecia era dia de reunião com a Missão Controlo, a fiscalização do Governo.
Corri para o meu quarto, para calçar as botas de segurança, foi me dado um capacete e parti para a Obra. Esta era imensa e parecia-me muito bem organizada.

Os brasileiros, que tinham vindo comigo no avião, e o Árabe também lá estavam. Este último era um dos chefes da missão controlo. Quando me viu ficou admirado e começou a fazer perguntas, em Francês. "Je ne parle pas François!" Respondi eu. E não falava. O meu francês ridículo não dava sequer para me apresentar. Tentei falar em Inglês, mas o homem também não percebia. Desisti!
Acesso à obra

Acompanhamos a obra toda. A fiscalização fazia perguntas, o pessoal ia respondendo e justificando o porquê de se estar a fazer daquela forma. Tentei por várias vezes apanhar o que eles diziam, mas não dava. Cansei-me de os tentar perceber. Mal apanhei o Davide um bocado mais à parte fui-lhe fazendo algumas perguntas e pedi que me explicasse o que se estava a passar.

"Vai ser difícil! Esta gente só fala francês!" disse eu. "Não te preocupes, aprendes rápido" disse o Davide "E não stresses, não és só tu que não falas francês, os brasileiros também não falam".

E era verdade, sempre que a fiscalização fazia uma questão era o Franco que respondia ou fazia de interprete para os brasileiros. "Bem" pensei eu "não sou a única".

À medida que ia entrando na obra apercebi-me dos olhares dos trabalhadores e dos berros "MUNDELLE", "MAMADOU".
 "Que é esta merda?" perguntei eu. "Mundelle é branca, em Lingalá, a língua deles, mamadou não sei o que é"disse-me o Davide.
Por onde eu passava via cabeças a rodar na minha direcção.
O encarregado da Obra, o Carvalho, veio ter comigo, cumprimentou-me e chamou o responsável pelos trabalhadores, o Cris. "Esta é a nova Chefe" disse ele em francês. "Chef?!!" disse o Cris muito admirado "D'accord".

Obra

"Quantos homens temos em obra?" perguntei, "Trabalham bem?"
"Cerca de 70" disse o Davide "Malembe, Malembe, mas trabalham!"

"Malembe. Malembe?! Que é isso?"
"Devagar devagarinho" respondeu ele a rir.

"Não se preocupe engenheira que aqui, quem puxa por eles sou eu" diz o Carvalho "Nada que dois berros não resolvam".

A obra era imensa, um hospital, os alojamentos dos médicos, funcionários e seguranças, e todos os anexos que faziam o hospital funcionar. As frentes de trabalham estavam calmas. Pelo que percebi a obra estava com um abrandamento por causa da falta de material, mas ainda assim era uma obra imponente,

O fim do dia chegou rápido. Antes de jantar ainda houve tempo para ir correr um bocado à volta do estaleiro juntamente com o Leo e o Samuel.

Jantei, fui para o quarto, desfiz as malas e adormeci...

Não esquecer o desporto

Base de Vida



Chegada a Dolisie

Sete da manhã e já estava no escritório. Malas feitas e carregadas na carrinha!
Era a última vez que via o escritório de Brazaville, pelo menos por agora.

As 9h30 fui para o aeroporto. Conheci o Yuriy e o Oleg, dois cimenteiros com quem já me tinha cruzado ontem, na obra de Brazaville, e que estavam de partida para Mandigou.
Fizemos as formalidades no aeroporto, o check-in. As malas iam carregadas de tesouras, x-actos e mais material de escritório que nos deram para levar para as obras, mas a segurança parecia pouco importada com isso.

Uma vez na sala de embarque, esperamos cerca de 1h pelo Voo.

O avião aterrou e foi feito o embarque. Parecia que tinha andado na guerra. Sujo, velho e com umas amolgadelas na chapa que nãos inspiravam muita confiança. Sentei-me no meu lugar favorito, em cima da asa. As pessoas foram entrando e o avião foi enchendo. A certa altura vi um caixão a passar. Os carregadores deixaram-no no banco de trás e prenderam-no com cintas.

"Medo!" Pensei eu.

A comitiva que seguia o caixão vinha a cantar e bater palmas. "E normal! Eles aqui choram o morto no primeiro dia e celebram nos outros 5" disse-me o Yuriy.

Dolisie, vista do avião
"Ok! Já tinha ouvido falar em celebrar funerais mas nunca tinha visto uma celebração como esta tão de perto."
"Tu para onde vais?" Pergunta o Oleg. "Para Dolisie" respondo eu.

O voo decorreu sem percalços. A viagem durou cerca de 30 min e foi animada pelos cânticos e as palmas do pessoal do funeral.
Para além de nós os três, haviam mais 3 brancos no avião. Dois Brasileiros e um Árabe.

Dolisie surgiu no horizonte. Do ar parecia uma aldeia com uma estrada e bairros de lata ao redor. Senti um friozinho na barriga. "Que fim do Mundo!" A paisagem envolvente era linda. Selva densa, montanhas, rios...

A aterragem foi tudo menos tranquila. Se não tivesse o cinto de segurança apertado bem que ia fazer companhia ao morto lá atrás. Foi a primeira vez que vi o avião a travar com o propulsor...
Propulsor

Mal me senti segura desapertei o cinto e liguei ao Davide. "Estou aqui! Anda-me buscar" disse, com a voz ainda a tremer do medo.

Ao sair do avião senti o ar quente e húmido. Comecei logo a transpirar. "Txi, que braseiro!!"
Na sala de desembarque fui obrigada a lavar as mãos. As enfermeiras tiram-me a temperatura e levaram o meu passaporte. Entrei em pânico! O meu passaporte! "Excusez moi madame, Mon passaporte..." mas nada...

Encontrei o Davide junto ao tapete das malas. "Não sei do meu Passaporte" disse-lhe eu. "Não sabes? tás Fodi#@" disse-me ele em tom de brincadeira. "Não te preocupes, elas já to dão"

Esperamos quase 1h pelas malas. Quando saímos do aeroporto estava cheia de fome.
Aeroporto de Dolisie

Entramos no carro e Dolisie começou a surgir ao som de música sertaneja. "Até aqui vou ter de ouvir esta treta!"

A cidade não era tão má como parecia. "Esta é a terceira maior cidade do Congo, não podia ser muito má", pensei eu. A maior parte das estradas são de terra batida e completamente irregulares, mas também há ruas com betuminoso. As pessoas pareciam que nunca tinham visto uma branca. O carro passava e ficava tudo a olhar. Que situação!

A base de vida de Dolisie fica a uns bons 5 km do aeroporto, no entanto, nestas estradas, o caminho parece que nunca mais acaba. Quando saí do carro pude finalmente ver o sítio onde ia passar os próximos seis meses.

Na frente da base de vida havia um muro com as palavras Bem-vindo. Do lado direito estavam hasteadas 3 bandeiras: Republica do Congo, Brasil e Portugal. Atrás do muro estavam os benditos contentores. Dois grandes na frente, o escritório e o refeitório, e os quartos vinham atrás.

Fui muito bem recebida pelo Eng. Franco, o Samuel (chefe de base de vida), e os engenheiros brasileiros da fiscalização: Leonardo e Vicente. O Samuel mostrou-me os meus aposentos e alertou-me para o facto de não haver água potável canalizada. "A água com que nós tomamos banho e lavamos as mãos é água do rio. Não é o melhor mas é o que há".

Fomos almoçar...




O meu contentor




domingo, 22 de fevereiro de 2015

Brazaville - A Noite!

Já alguma vez viram camiões lotados até cima, com animais vivos, pendurados por cordas? Já alguma vez viram uma família de porcos na mala de um carro? E cabras a passear livremente no meio da cidade?

Pois, eu também não, até vir para cá. Não sei se ainda serão efeitos da ressaca de ontem...
Sim, vou começar este "post" por aí.

Ontem, depois de um dia bem cansativo, fui jantar à base de vida, tal como já mencionei.

Ah! O que é uma base de vida? Bem, basicamente é o sítio onde os trabalhadores da obra ficam. Um conjunto de contentores com quartos, salas de convívio, escritórios e refeitório onde as pessoas vivem e trabalham.

Fomos jantar, eu, o Tiago, o Daniel, o Duarte e o Nuno. Como últimos a chegar já não nos esperava muita comida. Sem problema! Dividimos um pastel de atum para os 5, raspamos o tacho de arroz e fizemos a festa. O Pedro, engenheiro da Obra da VW, juntou-se a nós pouco depois. Começamos então um campeonato de Ping-pong e surgiram as ideias de: "Vamos sair?", "Vamos para a nossa casa, compramos bebidas e jogamos umas cartas?", "Vamos ver filmes e fazer pipocas?".

Obviamente que a bebida e as cartas ganharam. Fomos para casa. Puxei das cartas e abri o "anel de fogo" (um drinking game: Ring's of fire). Desgraça completa...
Quando demos por nós estávamos sem o Daniel, que ficou adormecido no sofá, numa carrinha a caminho da discoteca mais "IN" de Brazaville.

Compramos uma garrafa de RED LABEL, ou melhor, eles compraram porque eu, no meio da euforia, apercebi-me que me tinham trocado o dinheiro errado no Aeroporto e que em vez de francos cfa tinha francos da África central. Anyway, a garrafa foi-nos trazida à mesa e em 10 min estava vazia. "Faz muito calor aqui!" :)

Dançamos a noite toda. Eram só chineses e brasileiros na discoteca. De vez em quando lá se via uma congolesa a passar, mas rapidamente desaparecia no dinheiro/mãos de algum branco.

Saímos da discoteca para tentar a sorte noutra. A confusão nas ruas era imensa. O pessoal tinha montado outra discoteca no meio da rua. Na confusão recolhemos três Congolesas que se apoderaram da parte de trás da pick-up.
"Elas aqui fazem tudo por dinheiro", diz-me o Tiago, "Estas estão a ver se têm sorte com algum de nós".

Fomos até à baixa e duas das Congolesas desistiram da nossa companhia. Entretanto, experimentamos outra discoteca, mas o cansaço e a "animação" já começavam a pesar.

Saímos e fomos para casa (sempre com a congolesa no nosso encalço). Cheguei a casa e fui-me deitar. O que aconteceu à congolesa não sei, O que é certo é que de manhã às13h, quando saí para ir almoçar, ela já lá não estava.

Fomos almoçar só três pessoas, Eu, o Nuno e o Pedro. No caminho paramos para comprar pão e foi aí que eu vi algumas das preciosidades que enumerei no inicio do "post".

Percebem agora a minha dúvida? Será que vi mesmo?

Vi!
(Não tenho fotos, infelizmente, porque os congoleses não gostam de fotos e quando as tiramos, mesmo que seja só à paisagem, normalmente são-nos cobradas por algum que esteja mais próximo e que se aperceba)

Depois do almoço ainda fui dar uma volta de carro. A cidade de Brazaville é um caos de trânsito e urbanismo. Nem parece a capital. A pobreza é muita, mas também há muito aproveitamento da "pena" dos turistas ou novatos.

Voltei para casa. Passei a tarde toda a falar com a família e os amigos via Skype. Amanhã vou para a Obra dizia eu! Nunca mais chega amanhã,
Chegou mais rápido do que o que pensei.


sábado, 21 de fevereiro de 2015

Brazaville

Ruas de Brazaville


“Vais ver o que é um Obra a sério” diz-me o director Geral da Empresa. Entramos na Pick Up e lá vamos nós.

Foram 45 min de viagem, em estradas mais ou menos esburacadas. A conversa sempre em volta do: “Porque é que vieste para aqui? Achas que és capaz? Isto não é fácil!”. Na minha mente repetia-se a ideia do “Eu sou capaz! Se quiser o mundo vou tê-lo”. Pensamento algo pretensioso, mas que nas horas certas dá força para mover montanhas.


Estradas
A estrada estava carregada de camiões acidentados. Pelos vistos há imensos acidentes por aqui, ou porque as máquinas não são boas, ou porque não há peças para reparar e as viaturas são usadas até não poderem mais, ou porque os motoristas adormecem, ou desviam por caminhos menos próprios… Enfim, nada que não aconteça também em Portugal, mas o impacto aqui é brutal. Não há limpeza de vias, os camiões ficam abandonados na beira da estrada e com sorte, o corpo do motorista acidentado também.




Chegamos à obra: Mandelei, Parque industrial. “Esta merda é enorme!” penso eu. Eram 12h quando passamos o portão da obra. Como era um sábado os trabalhadores estavam concentrados à porta à espera do autocarro. No meio da fila, o Daniel, director geral, vê uma pessoa conhecida e pára o carro para a cumprimentar. Mal o vidro da carrinha desce só se ouve “chef, chef”. A pessoa cumprimentada era o David, electricista. Sou-lhe apresentada e começo a aperceber-me que tenho os trabalhadores nacionais a “colar” em mim. “Não é normal verem brancas aqui” diz-me o Daniel, “Muito menos numa obra e num cargo de chefia”. Pensei para mim “Vai ser complicado, isto. Quer dizer, sempre que passar por eles vão ficar a olhar para mim com ar de parvos? Mau!!!!”

No escritório da obra encontrei um colega de curso, o Roberto, que é o director de obra em Mandelei! Estava com ar abatido, mais forte e menos conversador. Perguntei-lhe o que se passava e ele disse que estava com a malária.
Pensei para mim, “Se a malária deixa este gajo assim, quando for comigo estou f0d*d”.

Estivemos à conversa durante a hora do almoço. O refeitório da base de vida era imenso e tinha bastante bom aspecto. Vi saladas frescas expostas nos tabuleiros, fruta, comida Congolesa. Comi apenas arroz. Estava assustada com as descrições das doenças de que me tinham falado na consulta do viajante.
Passamos a tarde toda a ver a Obra juntamente com a fiscalização de uma outra empresa que trabalha connosco. A obra era imensa e estava quase em fase de entrega, no entanto ainda havia alguns detalhes a acertar...

A minha cabeça estava cheia de informação... Mais, mais... Porquê que isto é assim? E aquilo?... Isto está mal?! Porquê?...
Saímos da obra eram quase 17 horas. Estava super entusiasmada e cansada... muito cansada. 

Pelo caminho ainda passamos em mais duas obras: Churrascaria de um ministro, uma espécie de night club/ Restaurante que destoava completamente da envolvente de barracões em chapa; e Hospital de Brazaville. 
Churrascaria

A noite foi caindo, e como caiu rápido... Entre as 18h e as 18h10 a sol desapareceu completamente.
Chegamos à porta da casa onde estava hospedada e saí do carro.

"Até à próxima!" Diz-me o director. "Vai-te a eles!".
O carro arrancou e eu fiquei parada à porta de casa. "Tu consegues Sara! Vamos lá!"

Entrei em casa e o pessoal já se estava a preparar para sair para ir jantar à Base de vida do VolksWagen (outra obra da empresa).

Tomei banho, vesti o meu fato de treino e saí...











sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Partida

Partida
Bon soir/ Boa noite

Esta é a mais recente realidade com que tenho de lidar. Saí de minha casa, da minha cidade e do meu país para partir rumo à aventura de um novo mundo.
A verdade é que sempre quis sair de Portugal mas nunca pensei que viesse parar ao Congo.
Quando aceitei o trabalho preparei-me mentalmente para o pior cenário possível. "Ok! Vou para África, para as obras, trabalhar com pessoas que não conheço, vou ser a única mulher em estaleiro e a minha casa vai ser um contentor. Vou morar no trabalho, viver para o trabalho, respirar trabalho"
Penso que não seriam todos que aceitariam trabalhar sob estas condições, mas eu aceitei. É a minha oportunidade para provar, a mim mesma, que consigo ser Directora de Obra.


Parti na sexta-feira, dia 20 de Fevereiro. Para trás ficaram os meus pais e a minha irmã. À medida que o comboio acelerava crescia a minha ansiedade e rolavam-me as lágrimas pela cara. Várias vezes repeti: "Vai ser duro, mas vais conseguir!" No aeroporto as horas nunca mais passavam. Sozinha, sem internet optei por passar o tempo a pesar as malas e a trocar euros por francos. Quando o avião levantou pensei: "Agora não há volta a dar. Já fostes!"

Em Casablanca, onde fiz uma escala de quase 3 horas, conheci dois Portugueses que iam para o Congo, tal como eu. Um homem e uma mulher. A Mulher ia visitar o marido, também ele Engenheiro Civil. O homem trabalhava nas fazendas do Presidente Sassou, no Ohio. Chamava-se Custódio e foi-me  apresentado um Congo completamente diferente daquilo que estava à espera. Nas palavras dele iam-se desenhando novos contornos de um Congo onde até era agradável viver. Um Congo com pessoas afáveis e trabalhadoras. A conversa durou horas...

Brazaville surgiu depois de quase 18h de voos e escalas. O meu corpo dorido não me permitiu vislumbrar o horizonte pela janela do avião. Só queria ir dormir, fosse onde fosse. Foram-me buscar ao aeroporto e deixaram-me na casa onde ia passar os próximos dois dias.
"Isto não é assim tão mau" pensei eu. Tem avenidas com betuminoso, tem luz, tem casas bonitas...."


Mal cheguei ao quarto, só tive tempo de avisar a minha irmã que tinha chegado e adormeci.

Três horas volvidas e sou despertada pelo telemóvel, "Allor au travail!".

Ao pequeno almoço conheci as pessoas que estavam hospedadas na mesma casa que eu: Daniel, Duarte, Tiago e Nuno (que me tinha ido buscar ao aeroporto no dia anterior). 

No caminho para o escritório a minha testa ia colada ao vidro. A cidade, ainda a acordar desenrolava-se pela janela. 

Salta a vista a discrepância entre o local e o estrangeiro. Há casas fantásticas e barracos a dividir a mesma rua, As estradas, que não são principais, são esburacadas. Mas buracos a sério capazes de partir o eixo a um Hummer. O transito é caótico. Regras de estrada: Tentar não bater! As ultrapassagens são uma constante e consegue-se fazer ultrapassagens de ultrapassagens :) Cerca de 90% dos carros que circulam nas estradas são táxis e os restantes são jipes de empresas. 

Chegamos ao escritório da empresa. Começa o trabalho efectivamente. O e-mail já está a bombar. As 10h saio para o campo.