domingo, 29 de março de 2015

Libeni - As maravilhas da Selva

Para ser sincera, muita da minha vontade de querer trabalhar em África sempre teve muito a ver com os documentários de Natureza Selvagem que passam ao sábados, ao meio dia, na televisão Portuguesa.
No fundo eu tenho toda uma biologa reprimida no meu amâgo, ou até quem sabe uma costela de Indiana Jones. O que é certo é que eu não gosto de estar parada. Trabalhar todos os dias das 7h as 22h estava a tornar-se cansativo e eu tinha que fazer alguma coisa.
Numa das minhas visitas à obra, e aproveitando o facto de o meu colega "workaholic" estar de férias, falei com alguns trabalhadores sobre o que é que eu podia ir conhecer alí a volta da povoação. A maior parte olhou para mim, como quem diz: "Esta mulher é tola, tem aqui uma cidade e quer ir ver mato". No entanto, o apontador, que já me começava a conhecer, lembrou-se que havia umas cascatas a uns quilómetros da cidade.



No meio disto tudo, o engraçado foi a nossa conversa. Naquela altura o meu francês era rico em vocabulário de obra mas e perguntar coisas não relacionadas com a obra? Que filme!
O google tradutor tinha sido uma óptima ideia, não fosse estar o céu encoberto e o satélite com pouco alcance. Esquece google.
 - Chris! - disse eu - Tu coné quelque chose pour moi regarder? - perguntei eu num francês, tal como está escrito (Chris, conheces alguma coisa para eu ver?)
 - Oui mamã! - disse ele - Il ya beaucup de choses dans la cité? - disse ele- Il ya le marché, le boulangerie.... (Sim mamã. Tens muitas coisas na cidade. Tens o mercado, a pastelaria...)
- Chris! - voltei a dizer eu - Isso não cara$%#! Je besoin sortir. Je besoin serché les animaux, voir les cobras, le fleuve... Qualquer coisa pah. (Eu preciso de sair daqui. preciso de procurar animais, ver as cobras, ver os rios)
- Mamã - disse ele - Il y a cobras dans le marché et beaucoup des animaux aussi... (Há muitas cobras no mercado, e outros animais também)
-Chris!!! - disse eu já com os nervos- Sorti de Dolisie! Pegar no carro/voature et sorti!!! voir le nature, les arvoux le tout (sair de Dolisie. Pegar no carro e sair. Ver a natureza, as árvores... tudo).
Nesta altura tinha o Chris a olhar para mim como se eu fosse um bicho estranho. E era! Que raio de Francês era este? Eu digo-vos. O Francês de quem estava enclausurada em obra à 2 meses e que só saía para ir à pastelaria.

O que interessa é que acabamos por nos perceber:
- Oh mamã- les shuts, les shuts!!! (As cascatas, as cascatas)
- Le Quoii? (O quê?)
- les shuts, l' eu qui tombe.... (As cascatas, a água que cai)
- Humm, je ne comprende pas... (Não percebo)
- L'eu, comprend? (Água, percebes?)
- Oui (sim)
- Il ya le fleuve en haut e aprés l'eu tombé beaucoup.... (Há um rio, em cima, e depois a agua cai)
- AHHHHH!!! (o que é um facto e que não tinha percebido nada) - ce jolie ca? (e é bonito)
- Oui oui. Mais etre beaucoup loin (sim, mas é longe)
- Ce bom. Dimanche on vais pour lá. (No Domingo vamos lá)


Espalhei a palavra pela obra: "Pessoal, Domingo temos passeio! Não sei muito bem onde vamos mas saímos as 7h". Liguei para as outras obras nos arredores: Sibiti e Mandigou.
Sibiti era uma das melhores obras também, mas a pessoa que dirigia a obra estava mais preocupada em beber as suas cervejas e dormir o Domingo todo do que eu sair da obra para aliviar um bocado o stress. - "Não tens trabalho aí? Se quiseres eu arranjo-te." Foi a resposta que ouvi. Desliguei o telefone e disse "Vai-te fuuuu".
Mandigou, dirigida por pessoas mais descontraídas aceitou logo. Ficaram todos entusiasmados. "Bora, tava a ver que não" Foi a resposta do outro lado.

Domingo chegou. As 7h da manhã tinha o Stany, o nosso chefe de electricidade Congolês, à porta da cantina. Ele é que ia ser o nosso guia.
O pessoal da Obra também já estava quase todo no refeitório. Fizemos sandes com os panados que tinha pedido para fazer no dia anterior, tiramos as cervejas do frigorífico e pusemos nas arcas, carregamos as carrinhas e ficamos à espera do Pessoal de Mandigou.

Uma hora depois partimos rumo ao Libeni.
A minha carrinha ia eu a conduzir. queria lá saber que eles não gostassem de ver mulheres ao volante. Tinha ali a oportunidade de fazer Rally: uma pick up, estradas esburacadas.... Vamos lá!!!


A quantidade de acidentes idiotas por km era impressionante



40 min de viagem, alguns quilómetros volvidos e deparamos-nos com uma pequena Aldeia. Mal chegamos os aldeãos correram para ver o que estava a passar. Quando viram as carrinhas começaram a trepar para as caçambas. Para muitos era a primeira vez que andavam de carro.
Fiz ainda uns metros com quase 30 crianças na parte de trás da carrinha, até que por fim paramos.
Deixamos os carros no meio de ervas altas e dissemos aos aldeões para nos tomarem conta dos carros que nós quando voltássemos íamos pagar bem o trabalho.


Maldita a hora que falamos em dinheiro. Queriam receber o dinheiro na hora, tinha que ser naquele momento, porque depois podíamos fugir... Tivemos sorte, O Stany, diplomata por natureza, meteu ordem na confusão que se tinha gerado no entretanto e conseguiu acalmar a população.


Seguimos a pé o resto do caminho.
Alí estávamos nós com as arcas de comida às costas, no meio da vegetação, sem armas...
Andamos, andamos e andamos.... A certa altura já não sabíamos onde estávamos... cansados, encharcados no nosso próprio suor, com o sol a torrar a cabeça...
4km, no meio da selva não são fáceis.










Já estávamos prestes a desistir. Parecíamos as crianças quando já estão saturadas: Já chegamos? Ainda falta? 
Foi então que a vegetação se começou a adensar. O calor deu lugar à frescura das árvores. Ouvíamos os macacos ao longe.
De repente o nosso espírito foi renovado.



 Vimos água. Era um óptimo sinal. Estávamos perto.
Com esforço já se conseguia ouvir a cascata. Cascata!!!!! Shut é cascata!!!! Finalmente tinha percebido.


Passado meia hora chegamos ao nosso destino. Tirei a roupa e mergulhei. Aliás, mergulhamos todos. Que alivio!!!!
Custou mas compensou.



O Libeni era um dos sítios mais bonitos aonde tinha estado. Ou então estava muito calor, e eu estava no Congo, desesperada, e pareceu-me um paraíso. Também é uma hipotese.
Nadei com cobras e sim,,, foram os únicos animas que apanhamos durante toda a viagem.
Ouvíamos macacos ao longe mas não passava disso.

Não há animais selvagens no Congo. Os congoleses não deixam!!! (Um dia explico-vos porquê).

Deixo-vos um filme filmado por um dos nosso colaboradores, o Andrei:

https://www.youtube.com/watch?v=5BXVDCY0LfI&sns=fb

O video está em russo mas expressa bem a nossa aventura e a nossa sensação. De lembrar que o Andrei e um grupo mais pequeno iam mais atrás porque iam com as arcas da comida :)


Btw, quando voltamos os nossos carros estavam intactos e a comida que sobrou fez a alegria da população.



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